18 de março de 2015

Destino...

Abro o coração e deixo a minha alma cansada
Explodir num grito de revolta contra tudo e contra todos
Cansado de cabrestos, exorcizo tudo que me exorciza...
Entre orações e invocações... A m'alma entra em erupção
Os meu nervos e os meus ossos, estão à flor da pele
Solto o laço que segura o ser bestial, que habita em mim
Abro as portas do inferno... 
Há um incêndio incontrolável em andamento
Mil demônios acordaram, e estão famintos
A luz e as trevas travam uma luta 
De vida, cansaço, doença e morte
Você consegue ouvir o tropel dos cavalos 
Correndo para a frente de batalha?
Ouve o som de aço das espadas?
Escuta os gemidos das putas 
E os gritos das prostitutas?
São os gritos e os gemidos dos meus ancestrais
Que lutam e vivem, fantasmas, dentro de mim
Sozinho no meio das chamas das florestas incendiadas da alma
O meu coração se desintegra em mil pedaços
E o atavismo inevitável começa no fundo da alma
Num instante de descuido... 
A fera que vive oculta dentro de mim
Sob à superfície da minha pele
E sobrepuja o homem que eu sou
Quem me vê agora
Não me reconhece mais
Rosno... Faminto... Grito... Imploro
Tarde demais! Grita o destino... Tarde demais!
Acuado... Forço os olhos contra a escuridão... Nada!
Até as maiores distâncias que os olhos enxergam
Tudo é nada... Tudo é indiferença... Tudo é ingratidão
O ar se enche de ameaças. Um pastorzinho de nada, vem
Mas engole as palavras... Pobre homem fraco
Ele não suporta o meu olhar... Não sabe mergulhar
Tem medo de abismos profundos... 
É uma criança com medo do silêncio
Mas o silêncio é tudo que tenho para ele
E o silêncio é uma navalha que corta a alma
Ele parte, caminha rápido como quem foge do diabo
Ferida, a alma se acalma... Mas nos interstícios da dor...
Sombras penetram e se movem na escuridão do coração
Grito... Corro... Mas não há onde se esconder
Guardo a vingança para um momento apropriado
Num ritual de desespero... Invoco a luz
Mas ainda falta muito até o dia amanhecer
Paro... Encolho-me num canto da floresta
Perco-me entre as sombras da noite
Canto para espantar a dor
Olho pelo buraco da fechadura
Cães rondam a casa
Está frio... Sinto fome...
A solidão devora e apavora
Talvez, agora, prese nesse quarto escuro
Eu seja o homem mais solitário do mundo
E estou tão rodeado de gente...
Falo sozinho
Faço o sinal da cruz
Deus meu! Deus meu!
Oh! Miserável de mim...
Que pobre diabo! Que pobre diabo!
Faltam-me as forças necessárias
Para enfrentar tão grande danação
O meu destino me desatina...
Essa depressão desgraçada
Sob os meus pés a areia é movediça
Em sonho... Ouço a voz da minha mãe
Escuto o riso dos meus irmãos
Um velho profeta grita ameaças:
Todos mortos! Todos mortos!
Acordo de repente... Estou sozinho na voragem do mar
Afundo no nada... As ondas da tempestade 
Me roubam o ar... A minha alma afoga
Mais uma vez estou a afundar
Você consegue ouvir o riso dos tubarões?
Ainda sonho?  
Talvez eu nunca tenha dormido...
Deus, onde estás?
Não quer ser a minha Mãe?
Não quer ser o meu Pai?
O céu me parece ser um lugar tão silencioso... Frio, às vezes
O silêncio e a escuridão, persistem...
Deus é um ser tão calado... Eu já esperava
Hoje eu não estou para conversas telepáticas
Calo-me, também... Mais uma vez
Que o silêncio seja a minha oração
No fundo da minha alma, num esforço derradeiro
Ergo-me contra o peso do meu destino
Que venha o céu... Que venha o inferno
Não me vergo mais sob o penso 
De uma carga que posso evitar
Tenho ainda alguns versos na alma
Quando a depressão passar... 
Quando a solidão amainar
Posso iniciar um jardim 
Nas profundezas do meu coração
Posso acender uma fogueira 
Do tamanho da minha poesia
Uma sentença paira sobre mim... 
O deserto não me vencerá
Eu levo comigo as sementes de um jardim florido
Não importa o desatino... Para o inferno com o destino!
Tudo depende de um bom destino
Preciso, então, construir um bom destino
Uma sina ruim, herança dos meus antepassados
Subscreve a morte dos meus sonhos
Sonho, então, sonhos eternos
Mas eles some, quando o dia amanhece
Um dia desses esbarrarei
Numa árvore de luz
então, construirei uma casa
Onde colherei frutos e sementes
E plantarei na minha alma um jardim
Para iluminar a escuridão do meu mundo
De repente, uma mão pousa no meu ombro
Talvez um anjo...Talvez um demônio, que finge ser anjo
Oh, meu Deus! Como é fácil se enganar sobre si mesmo
Como é fácil ser traído pelo próprio coração
Tolo! Guarda as suas esperanças
O amanhã será só o hoje que se repete...
Aceita o seu destino... Sê homem!
VBMello

17 de outubro de 2014

Tempo morto


Das coisas que eu queria antes
Não quero mais nada
Dos sonhos que sonhei
Não sonho mais
O que me encantava
Não me encanta mais

Velhas recordações 
Tempestades
Ondas que reviram
Saudades e dores
De um tempo morto
Perambulam - ainda vivas
Pela superfície tempestuosa
Dessa minha velha alma triste


Tempestades de sentimentos
Que ressuscitam e desenterram
Outros sentimentos esquecidos
E avivam lembranças mortas 
Marcadas e sublimadas
De antigas feridas 
No corpo e na alma
E trazem à memória a sombra
De antigas noites de angústias sem fim


A revolta, a fúria, a tristeza
As perdas, as humilhações
A indiferença e a zombaria
Nada me humilha mais
O corpo e a alma agonizam
Sob o fardo dessas recordações
A realidade nua e crua
É exaustiva demais
Para o meu fraco coração


Mesmo depois de tanto tempo
Tempo suficiente 
Para um menino descalço 
Virar homem feito
As ferida ainda estão abertas
E as recordações ainda
São tão insuportáveis
Que eu prefiro pensar 
Que tudo foi um sonho


Fecho os olhos e finjo 
Que aquelas são dores
Que nunca aconteceram


Mas não é coisa fácil
Enganar a si mesmo
Nada mais dolorido
do que enganar a si mesmo
E mesmo assim, apesar de tudo
Nada mais necessário


A minha mente se engana
Mas o meu corpo - velho sofredor
Não se deixa mais convencer
Pelas mentiras repetidas
Que a minha consciência
Conta para a minha alma


Mesmo quando é dia claro
Levo comigo, a escuridão da noite
O passado dolorido, ainda está comigo
Não há como mentir sobre isso


Lá fora... Vejo pela fresta da janela
O sol brilha num céu azul aguado


O dia está amanhecendo
É a pior hora do dia
Escuto alguém rindo
Encolho-me num canto
Cubro a cabeça
Tapo os ouvidos
Faço cara de desprezo
Tudo me incomoda
Tudo me aborrece


Nas profundezas do meu coração
Um vulcão ameaça-me 
Com a fúria das suas erupções
Dou de ombros... Que se dane
A minha alma já entrou em erupção
Outras tantas vezes, e nada mudou
Mostro-lhe o dedo médio em riste
Filho da puta! Quase grito, mas me contenho...


Não sou homem de xingamentos
Sou homem de tormentos calados
Perdoem-me o desabafo
Ora, vá para o inferno!
Ao entrar, deixa lá fora
A piedade e a compaixão
Estou além desses mesmices


Metade sonho
Metade pesadelo.
Um ser triste
Metade vida
Metade morte 
Habita dentro de mim
Narciso que se enamora
E se devora...


Lá fora, bandos de pardais se amontoam 
Nos galhos tortos de uma árvore velha
Que sem nunca ter produzido uma flor 
Ou sequer um fruto mirrado
Sofre e morre - bem na frente da minha janela
Tenho uma grande compaixão 
Por essa miserável árvore estéril
Somos tão iguais... Somos filhos do mesmo nada
Metáforas um do outro... Eu a plantei
Como eu, ela foi uma criança viva e feliz
Mas então, algo aconteceu... Agora secamos e morremos
Abraçados um na sombra do outro... Espinheiros recíprocos


Oh, meu Deus! Como um rato trancado 
Dentro de uma caixa escura... Apreensivo
O coração salta pesado de ansiedades
Ouço janelas que batem e portas que rangem
Ouço vozes e passos... É a pior hora
A tristeza vem e me abraça... E me consola


Meu espirito agoniza e chora
Indiferente... Sem me levar com ela
A vida segue cega e surda
Mostro-lhe o dedo médio ereto
Grito-lhe um palavrão
E viro-lhe as costas
Que vá para o inferno!
sim, que vá para o inferno


Indiferente, a natureza não para
Diante das ondas de um mar cristalino


Flores desabrocham no jardim
Belezas e ritmos que sobrecarregam 
A minha alma de melancolia
O mar tão belo e verde
Quebram mansamente na areia da praia
Não me importo... Hoje não é dia de praia
Não me importa o chamado do mar
Hoje o meu destino é a solidão do deserto


Carros passam melancólicos... A vida segue
A depressão, mais uma vez, me esgota
Deus meu, onde está? Não chegou aí no céu
Nem uma só das minhas orações?
O som de uma TV invade 
As profundezas da minha alma
Instintivamente fecho na cara do mundo
As portas dos meus abismos
Estou só... Hoje não quero ver TV
Sim, estou só, completamente só
Embora haja gente do meu lado
Eu já era para estar acostumado
Mas não estou...


Fui gestado há dez mil anos atrás
Num útero cheio de cacos de vidro
Vergonha... Raiva... Decepção
O coração clama por vingança
A minha casa é o lugar mais longe do mundo
Um lugar onde tudo morre, animais, plantas e sonhos
Agora, nesse momento esperança que eu ainda tinha
Se transformou em forte ânsia de vômito
Preciso vomitar essa raiva...


Imaturidade! Imaturidade! Imaturidade!
Grita uma voz sofrida dentro de mim...
Imaturidade! Imaturidade! Imaturidade!


Recolho-me num canto escuro
A escuridão me faz bem
Dentro e fora da alma 
O silêncio é tudo que há


Hoje não quero conversa
Já que não tenho direito
De dizer coisa alguma
O dedo médio, sempre em riste
É a minha defesa contra as dores da vida
Uma porta se abre... 
Se dentro ou fora da minha alma, não sei dizer
Deito-me e viro a cara para a parede... Fecho os olhos


Acordado, quase durmo... Rolo na cama de um lado para outro
A noite chegou e eu nem vi... Pesadelos me sufocam 
Meus olhos ardem de insônia... Diante de mim... Oh, horror
Os fragmentos da minha vida, amontoam-se 
Como os restos de um naufrágio
Ah, esqueci de dizer... Estou de partida para uma longa viagem


Fecho os olhos e arrumo as minhas coisas
Vou por caminhos estreitos
Por onde se anda melhor sozinho
De olhos fechados e coração aberto
Não levo bagagem nem dinheiro
Levo apenas a minha alma... E mais nada
Deixo-me para trás... E sigo sozinho 
Livre até de mim mesmo
Vou pelo caminho das estrelas
Levo fomes que anseiam por instantes de saciedade
Não levo esperanças, só algumas ilusões


Não levo, nem deixo saudades
Recolho e amontou na areia 
Os restos do naufrágio da minha vida
Restos de sonhos e pedaços de desejos
Fragmentos de vontades abortadas
Refugos de vida... As vergonhas vividas
As mesmas humilhações, mil vezes sofridas
O passado, o futuro - e o agora... Tudo

Faço uma fogueira... Ateio fogo
A carne queima, o sangue congela
As chamas se elevam ao céu
Que me chama
Que me reclama
Tarde demais! Tarde demais! Grito
A minha vida queima e os meus sonhos
Se desfazem em cinzas... O meu coração agoniza
Sacrifico tudo em holocausto a Deus
Em torno dessa fogueira das vaidades 
Danço uma dança macabra... Danço grito, choro...
Rolo no chão... Morro... Renasço... Torno morrer
E assim vou morrendo, até desanimar de ressuscitar


Capturado pela parte sombria da vida
Tombo diante do nada de uma vida desistida
Minha mãe ri... Meus irmãos zombam
Meus filhos... miseráveis... morreram todos
E eu morri com eles... E nenhum deles renasceu


Agora sou alma que vaga sem destino
Sou sombra que segue pelo caminho estreito
Sou a vida que se perdeu no colo da mãe
Sou o suicida indeciso parado na beira do abismo
A espera de um milagre? Mas milagres não existem mais
Sou Adão seduzido pela Eva seduzida
E a serpente gargalha desse meu espetáculo medíocre
Sou abismo desejante de altura... Sou morte desejante de vida


Sou anjo caído – traído... Sim
Chamam-me anjo caído, os meus inimigos
Todavia, nada sabem de mim...  Nada sabem de anjos
Dizem que estou morto... Mas nada sabem da morte


Ah! Num momento de liberdade
O coração parou... aquietou
Agora eu durmo profundamente... , e sonho
Então é que eu vivo... Um anjo vem e me toma pela mão
Zomba de mim, certamente... E me leva pelos seus caminhos de luz
Finjo que vou com ele... Cruzamos estrelas... 
Cruzamos mundos... Cruzamos céus... Tropeçamos na eternidade
Desço com ele até os confins da minha imaginação
Busco a mim mesmo..., nele... que me busca


Ele me olha dentro dos olhos
Por breve momento, coisa estranha, vejo-me nele
Mas ele não se vê em mim... Como poderia?
Somos anjos de natureza diferente


O maldito som do relógio
Me desperta dessa minha ilusão
Ouço som de pássaros cantando
Escuto vozes... É a pior hora do dia
O dia está amanhecendo... Levanto-me... 
É dia... Mais um dia, mas não outro dia


A vida chama 
Preciso correr
Para não morrer
Estou atrasado - de novo
Ponho os pés na rua
O meu coração estremece
A multidão me envolve


Forço as vistas, firmo os olhos
E procuro sem encontrar
Até as maiores distâncias que posso ver
Não vejo anjos... Vejo apenas lobos de outros lobos
Serpentes que rastejam ao meu redor... E isso é tudo
E somente então, por breve instante
É que me dou conta de que me tornei
Um homem quase triste... Quase morto... Quase feliz
VBMello