22 de outubro de 2015

Um lugar além...

Antes do amanhecer, enquanto a cidade dormia, eu chorei
O horizonte infinito, grita por mim
Quero ir, quero partir para nunca mais voltar
Mas as minhas pernas estão quebradas
Enquanto eu dormia sozinho
O corpo e a alma, ambos mergulhados
Na névoa fria da noite escura
As minhas asas foram arrancadas
Sobram-me céus azuis 
Faltam-me, porém, asas para voar
Tenho vontade, mas não tenho força
Agora, a minha casa não é um lugar agradável
Entre feras, eu habito
Inimigos me cercam
É com dificuldade e lágrimas
Que nesse chão escorregadio – e frio
Eu me sustendo de pé
A minha herança – é o nada
A minha incompatibilidade – é sanguínea
O ar que me envolve - é a solidão
A voz que me fala – é o silêncio
Mas nas entranhas do meu ser
Em lugares que ninguém chega ou vê
Um fogo arde e uma luz ilumina…
Sim, na minha alma existe um lugar
Que eu ainda guardo na memória
Um lugar que não existiu na minha infância
Mas que eu criei para o meu descanso e inspiração
Um lugar onde a escuridão dos meus ancestrais – não venceu
Um lugar onde o sangue do meu sangue – não coagulou
Um lugar só meu, onde a chuva das manhãs de primavera ainda cai
Onde os jardins ainda florescem e os rios ainda correm cristalinos
Um lugar onde a esperança ainda aquece e o amor ainda promete
Um lugar onde a alma das pessoas é mais limpa do que as suas casas
E os olhos brilham mais do que os espelhos
Para este lugar distante e profundo (essa prisão de luz)
Quando o deserto me envolve e o frio me abraça
Eu sempre volto – sem revolta – nos dias de revolta…
VBMello

Eli, eli, lamá sabactâni

Todos os dias, como alguém que repete a mesma ladainha 
A minha oração, é uma só: Senhor, livra-me, de mim mesmo
Porque as batalhas da minha alma, são ferozes e dilacerantes
Graça jamais recebida... O Senhor, deixou-me entregue a mim mesmo
Estou só comigo, e a minha alma é uma arena de gladiadores
Um abismo de bestas selvagens... Um lagar de guerras sangrentas
Todo dia, querendo ir mais fundo, em mim mesmo
Travo batalhas sem trégua e sem perdão...
Todavia, não peço, nem imploro paz ou misericórdia
Sou assim... É a minha sina... Já não sinto dor
Acostumei-me com as minhas tenebrosas guerras interiores
Fiz da solidão, a minha mãe
E do silêncio, fiz o meu pai
Sou um cidadão das tormentas da alma
A minha alma é uma casa em chamas
Um errante da fé, da esperança e do amor
Navegar mares tempestuosos
E cruzar desertos, é a minha sina – e a minha loucura
Acostumado à noite escura e sem estrelas
Embora saiba que elas sempre surgem no horizonte
Não anseio mais por manhãs ensolaradas
Sim, a alma, essa vastidão sombria
Que cresceu nutrindo-se de tormentas e desertos
Em manhãs ensolaradas, desespera-se
Ah, tornei-me interiormente, excessivamente belicoso – e resistente ao frio  
Andar na corda bamba da existência, é a minha especialidade
Não me julgue pelos sorrisos 
Não me tome por um homem manso e sereno
Não me julgue pela aparência
Do avesso, eu sou muito pior do que pareço
Se quiser, se puder… Aproxime-se com cuidado
Em silêncio, sente-se ao meu lado
Torne-se um comigo… Encoste a sua cabeça no meu peito
Ouça os sons das minhas batalhas
Não, não se deixe confundir pelos sons que escuta
Pois estes não são os sons das batidas do meu coração
São os terríveis ruídos de batalhas ancestrais
O grito de guerra, o bramir da espada e o tropel dos cavalos
A herança belicosas que os meus ancestrais me legaram
Ah, meu irmão, meu igual... Dentro do meu peito
O juízo final, começou quando eu nasci…
VBMello