Nosso
mundo, nossa vaidade, nossa ilusão, nossa fantasia, nossa escuridão, nossa sina... Assim é, assim sempre foi,
assim sempre será... Amarrados pelas mentiras que os nossos pais nos
contaram, e acorrentados pelas mentiras que nós mesmos, que coisa estranha, como
se fosse fácil enganar o próprio coração, contamos para nós mesmos... Entre
a glória e a escória, seguimos os passos dessa estranha humanidade desumana,
tropeçando aqui e ali nos abismos desse mundo que jaz na maldade e se
afoga na lama das suas próprias mentiras.
Ah,
Deus... Num mundo de faces desgastadas e cansadas, que insiste em usar máscaras
de triunfalismo e felicidade, cheio de almas em declínio, indiferentes
habitantes ocos de uma ilusão em constante erosão, algumas coisas, por estranho
que pareça, nunca ganham nitidez, por mais que a luz brilhe...
Temos
olhos, mas não enxergamos. Temos ouvidos, mas não escutamos... É a nossa sina.
É a nossa sorte... Vivemos um tempo difícil para quem tem coragem de olhar a
realidade cara a cara... Melhor virar a cara, melhor fingir de surdo.
Então,
inconscientes dessa nossa louca e fingida cegueira, perdidos nas nossas
ilusões, reclusos, talvez escravos, de uma verdade que inventamos para
tentar justificar a nossa degradante situação, ou convencidos por
algum ser maligno, que sutilmente toma posse e preenche os abismos do
nosso coração, e que dia a dia, nos estimula mais e mais a fome de vaidade
e disfarça a nossa surdez e o nosso pecado, inventamos uma luz artificial para
tudo, e mascaramos de luz a nossa imensa e fria escuridão...
Com
as cores da nossa ilusão
Pintamos
a nossa escuridão
Contornamos
o incontornável
Assinamos
a ilusão com o nosso nome
Fingindo
que somos seres de luz
Maquiamos
o caos
Fingimos
uma felicidade
Que
não conhecemos
Sob
uma montanha de comprimidos
Escondemos
a ansiedade e sufocamos a depressão
Viramos
a cara, andamos noutra direção, e lavamos as mãos
Oh,
horror... Todo dia, ratificamos perante o céu, a nossa perdição... Ainda temos
uma alma?
Mas
a nossa imitação de luz
Não
chega para iluminar
As
profundezas da nossa alma
Nem
sequer serve para
Aquecer
a nossa alma
Menos
ainda, para incendiar
O
nosso pobre coração...
Na
face, coisa estranha, fingimos verão, mas na alma - Quem pode dizer que não? -
Sofremos as dores dos dias de inverno e o medo das noites de escuridão...
Longe
de Deus / longe do céu
Longe
da razão / longe de tudo
Criando
paraísos artificiais
Destilando
veneno contra tudo
Demonizando
tudo que é diferente
Fingindo
um amanhã que nunca virá
Escondendo
uma carta na manga
Mas
a nossa carta na manga
O
nosso ferrão
O
nosso mundo
O
nosso veneno
Sempre,
de um modo ou de outro
Alcança
sempre o nosso próprio coração
E
a nossa ideia de vida nova
A
oportunidade que esperamos
Para
virar a mesa e recomeçar
Deus
sabe... Deus sempre soube
É
só mais uma ilusão entre tantas ilusões...
E
apesar de tudo, e de todas as máscaras inúteis que forjamos para esconder a
nossa triste condição, apesar de todos e paraísos artificiais que inventamos
para alimentar as fomes da nossa alma, permanece ainda, e não poderia ser
diferente, por tempo indeterminado, a nossa prisão, as nossas algemas
e nossa tosca ilusão de fé, amor e liberdade...
_VBMello