3 de agosto de 2017

Uma gargalhada no fim do túnel...

Pobre homem! Pobre homem!
Canta um coro de anjos

Como uma criança solitária
Que encontrou a mãe morta
Caída no chão frio da cozinha

Você camufla o medo
E engole o choro

Você tem saudade 
De mares calmos
E céus azuis

Mas hoje os céus da alma
Estão cheios de nuvens de tempestade

Você esconde o horror
Atrás de um sorriso amarelo
Você finge que é feliz

Mas o seu mundo interior
É cheio de submundos
Habitados por fantasmas
E assombrações de traumas antigos

Você fala com Deus e faz as suas orações
Mas esconde o rosto atrás de uma máscara

No fundo, onde ninguém vê
Que coisa triste, você sabe
Que não acredita em deus nenhum
Será que Deus ainda acredita em você?

O mundo gira a mil por hora
E não diminui a velocidade
Para você descer e correr

Uma verdade amarga paira sobre nós
Eu e você - estamos perdidos 
Dentro de nós mesmos
Mais solitários do que nunca
Sujeitos às intempéries do mundo
Mais ansiosos que nossos pais
Mais preocupados que nossos avós
Vazios de sonhos e alma
Oportunistas de espírito
Estranhos ao reflexo inerte
Que vemos no espelho

Juramos que somos humanos
Mas o nosso coração nos trai
Sabemos a fera que somos
conhecemos a sombra que mora em nós
E no fundo, temos vergonha
De dizer: Isso sou eu.

Pobre homem! Pobre homem!
Que caos! Que escuridão! Que tragédia! Que comédia!
Quando foi que você desistiu de acreditar?
Quem te roubou a fé?
Quem te vendeu gato por lebre?
Quem colocou esse peso sobre os seus ombros?
Quem pôs essa preocupação na sua cabeça?

E essa angústia no seu peito, quem colocou?
Há um céu de bronze sobre a sua cabeça
Um chão de ferro sob os seus pés
Uma fome colossal na sua alma
E uma solidão que penetra os seus ossos
E você sorrir como se essa desgraça não fosse com você
Quem você pensa que engana com esse disfarce de felicidade?

Pobre homem! Pobre homem!
A sua alma é um cemitério de sonhos mortos
Vida triste, solitária e desamparada
Nenhum pai para te chamar de meu filho
Nenhuma mãe para te colocar no colo

Veja! Há um leão espreitando na esquina
E um demônio urrando dentro de sua alma
Há uma luta que nunca cessa
Uma dor que nunca dorme

Como um pedaço de madeira
Destinado a arder nas chamas
Você grita, chora e pragueja
A vida é uma arma engatinhada
E apontada para a sua cabeça
Mas você não se importa

Sem alma, sem voz, sem rumo, sem paz
Um monte de carne que agoniza e apodrece
Delirando e sonhando com as fronteiras da eternidade
Mas no fim do túnel, no fim disso que chamamos de nossa vida
Há apenas o silêncio dos mortos que descansam sobre o pó da terra
Não há nada de especial, nenhum prêmio, nenhuma recompensa
Apenas o som cínico e zombeteiro de uma gargalhada forte

Velho e cheio de cabelos brancos, você se olha no espelho
E sussurra triste: Ah, meu Deus, a vida é tão breve

Então, a risada no fim do túnel 
Trêmula - adormece 
E a luz se apaga

E os anjos entoam uma derradeira canção de calamidade
E sobre a lápide de latão enferrujado, um epitáfio ridículo
Pobre homem... Pobre homem de alma vazia e olhos tristes...
_VBMello 

1 de agosto de 2017

A mesma sina...

Os mesmo ares antigos
Os mesmos perigos
As mesmas repetições
As mesmas condenações
Outra história que se repete
A mesma sina
Renegado
Sem pedir
Sem desejar
Acidentalmente
Miseravelmente
Desgraçadamente
Nascer, sofrer e fazer sofrer
Sozinho na corda bamba
Sem peito nem colo
Sem afago ou carinho
Sem abraços e sem olhares
Estranho e sozinho no mundo
Imundo, descartável, desnecessário
Sem querer, num de repente
Sair de casa... Livre
Cheio de fome
Apaixonar, amar e desesperar
Trabalhar, vagabundar
Decepcionar, fugir e correr
Fazer de conta que é alguém
Conhecer o mundo
Conhecer tudo
Correr perigo
Tropeçar, cair
Sem querer, sofrer
Vergonha, humilhação
Voltar para casa
Morrer, ficar surdo
Ficar mudo
Perder a esperança
Comer o pão que o diabo amassou
Apavorado, viver de solidão
Sofrer, sofrer... Perder tudo
Sonhar para outro realizar
Lutar contra o demônio
O coração disparado
O sangue coagulado nas artérias
Soldado de mil guerras perdidas
Cair de joelhos diante de Deus
Dar murro em ponta de faca
Insistir até perder o sono
Gritar, chorar, explodir
Perder a fé
Perder a esperança
Perder a cabeça
Perder a alma
Perder a calma
Andar em círculos
Acreditar em milagres
Não acreditar em nada
Desconfiar de tudo
Perder a fala
Perder o equilíbrio
Sem nada para falar
Perder o tino
Viver no desatino
Nunca dizer não ao destino
Fazer planos definitivos
Meu Deus, o que será de mim?
Qualquer dia, no mar
No fundo do mar
Bem longe daqui
Onde ninguém vê ou sabe
Mergulhar, sumir, sumir
Perecer, desaparecer
Para nunca mais
Voltar para casa
Sem olhar para trás
Sem levar saudade
Sem deixar saudade
Esquecer tudo
Esquecer todos
Parar de respirar
Desocupar o coração
Lavar as mãos
Esfriar a cabeça
Pouco me importa
Conheço o meu lugar
Estou acostumado
É a minha sina
Morrer para renascer
Longe, bem longe, muito longe
Vagar por outros destinos
Conhecer – longe daqui
Outras realidades
Navegar outros mares
Respirar outros ares
Caminhar – sozinho
Na direção de outros horizontes
Quebrar o espelho, romper o fio de prata
Num piscar de olhos, sem avisar
Quando ninguém estiver olhando
Passar para o outro lado
E olhar Deus e o diabo - face a face...
_VBMello