27 de setembro de 2013

Alturas, Superfícies, Profundezas...

Na superfície, o mar encapela
O fogo se alastra e tudo devora
As ondas tornam-se violentas
O céu escurece
O sol se põe
A noite cai
O vento sopra forte
A tempestade furiosa...
Habitação de toda sorte de sombras
Hipocrisias, mentiras e vozes medonhas
Desaba sobre a fraqueza da carne doente
Que relegada ao relento, agoniza
A noite é profunda e ameaçadora
O caos tem fome
A escuridão tem fome
Anjos caídos tem fome
As trevas assediam e seduzem
Solitário, o barco ameaça soçobrar
Levado ao limite do desespero
Curvo a cabeça e me lanço na água revolta
Mergulho além da superfície do caos
O silêncio invade m’alma
De olhos fechados vou além da aparência das coisas
Esvazio o meu coração do peso dos seus vazios interiores
Duvido das minhas dúvidas
Em completa solidão
Nem bens, nem certezas
Nada possuindo
Vou além da superfície
Desço até as profundezas da minha alma
Afundo-me no pântano de mim mesmo
Armado com as palavras da minha boca
Enfrento meus demônios interiores
Adentro pelos portões de um bosque calmo e verdejante
Onde reina a luz e a bonança
E ali, bem-aventurado
À sombra da Árvore da Vida
Onde as trevas não se atrevem a chegar
Longe das mendicâncias da vida superficial
Envolto pelo sopro do Espírito
Deposito a minha armadura
As portas de m’alma guardadas e protegidas
Por espadas de fogo consumidor
No cume da mais alta montanha
Descanso...
V.B.Mello

25 de setembro de 2013

Vazio...

O Espírito de poesia hibernou
A alma perdeu a consistência...
Olho ao redor, tudo perdeu a cor e o sentido...
Uma pedra é somente uma pedra, e nada mais...
Uma flor não é mais que uma flor
Todas as coisas perderam a transcendência...
A fonte das palavras secou
E os olhos e os ouvidos
Nas coisas e nas pessoas
Em nada penetram além da aparência
Sem inspiração o poeta agoniza
Torna-se prisioneiro da aparência das coisas
Como alguém preso do lado de fora do seu próprio ser
Tem olhos, mas não vê
Tem ouvidos, mas...
A voz do próprio coração
Não ouve...
Nada o alegra
Tudo o aborrece
Sente-se pobre, inútil, pesado, desesperado...
O peso do vazio é insuportável
Sente que escolheu o caminho errado
Deposita a caneta sobre o caderno...
Lança todos os seus sonhos no fundo de uma gaveta qualquer
E com eles a sua alma
Enclausura-se... Pensa em desistir
Uma guerra terrível acontece nas profundezas do seu ser
Seu espírito abandonado pelo Espírito de poesia...
Estertora e sufoca...
Ele sabe, ansiando nascer, florescer e frutificar
Mundos estão represados nos recessos do seu ser
Seu espírito anseia tornar-se verbo, quer ter para si mesmo
Realidade, consistência, expressão, consciência e forma...
Mas desabam todos, esvaem-se como neblina ao nascer do sol
Antes mesmo que as palavras comecem a serem articuladas...
Derrotado pela impermanência da inspiração
Ao menos por hoje o poeta desiste de ser poeta...
Amanhã... Ou depois de amanhã
Talvez – ou talvez nunca mais
Ou qualquer dia ou noite
Nas profundezas solitárias da madrugada
O Espírito de poesia retorne e diga
Com voz suave ou num grito
No fundo do peito inerte e vazio
Haja luz!
E então haverá outra vez
Luz, inspiração, criação e poesia
Ou talvez nunca mais...
V.B.Mello